terça-feira, 28 de setembro de 2010

Lula, o pai do filme


Na quinta-feira (23/09), Roberto Farias - diretor do excelente "O Assalto ao trem pagador", 1962, que não merecia essa mancha em seu currículo -  anunciou a indicação do filme “Lula, filho do Brasil”, para concorrer ao Oscar na categoria Melhor Filme em Língua Estrangeira. A Comissão de Seleção, formada por membros do MinC, da Secretaria de Audiovisual, da Ancine e da Academia Brasileira de Cinema decidiu por unanimidade. Suspeitíssimo.

Que fazer? O filme é ruim, primário, tosco, boboca, piegas. Tão piegas que é capaz de ganhar o Oscar. É um equivalente daquele produzido durante a ditadura militar, em 1972, “Independência ou morte”.

Se não estivéssemos no Brasil, eu estranharia o silêncio do pessoal do cinema. Só Daniel Filho, que também concorria, chiou. Arnaldo Jabor, que faz poses de ousado e agressivo, preferiu dizer que não tinha o que dizer.

Aguardemos agora a indicação, pela Academia Brasileira de Letras, do Luiz Inácio para ocupar a vaga do próximo imortal que fizer a gentileza de falecer.

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

O homem que lia seu jornal


O homem já estaria lá quando cheguei, mas não o vi. Havia nele algo de invisível, eis a verdade. Nele e naquele paletó cinza, naquela calça azul-clara e naqueles sapatos pretos e amarrotados que calçava. Sentado numa mesa pequena, no fundo da lanchonete, junto à parede de tijolos a vista, ele me chamou a atenção quando moveu o jornal. Aliás, não foi o movimento que me chamou a atenção, mas o barulho – barulho de jornal sendo aberto, dobrado, remexido. Eu conhecia aquele barulho. Virei-me e lá estava ele.
O homem parecia uma mistura confusa de cabelos grisalhos, de paletó dormido, de jornal sendo triturado contra a mesa. E ele empunhava uma esferográfica. O que faria aquele homem naquela mesa de lanchonete lendo um jornal com uma esferográfica na mão? É verdade que ele tinha um ar investigativo, descendo os óculos de lentes grossas na direção do jornal, como se quisesse tirar dele o máximo possível. O que buscava?
Constrangido com minha própria curiosidade, tentei me concentrar no sanduíche que o garçom colocara na minha mesa. Tentei esquecer o homem. Não o esqueci. Me esforcei para não prestar atenção nele, só isso. Que me interessava aquele sujeito que jamais vira, com aquele ar cinzento, com aquele modo desastrado de ler jornal? Foi quando notei um detalhe: o homem não se servira de nada. Na mesa, só o jornal e a esferográfica.
Ele oscilava para frente e para trás. Amolecia-se na direção da mesa, como se ele fosse um imenso edifício desabando em câmara lenta, e, depois, vítima de um pequeno susto, voltava a se aprumar. Estava cochilando. Ali, no meio da lanchonete barulhenta, com gente falando alto, rindo, discutindo, o homem cochilava.
E cochilava de uma forma decidida. Cada vez que sua cabeça descia na direção da mesa, ele ameaçava afundar muito além do jornal, como se cumprisse alguma jornada da qual não quisesse perder detalhe algum.
Pensei que ele poderia, numa daquelas investidas na direção da mesa, bater a cabeça, espatifar seus óculos, ferir-se. Mas ele era dotado de algum mecanismo de controle. Quando estava a uns três centímetros da mesa, sofria um golpe assustado e retornava a cabeça para trás. Era muito hábil nisso.
Que idade teria? Setenta e cinco anos, algo assim. Era o que dizia o rosto castigado, as orelhas enormes, os olhos tristes. As mãos também eram antigas, lentas e antigas. As costas curvavam o paletó cinza, criando uma previsível corcunda pontiaguda. Tudo era meio surrado, meio velho e antigo naquele homem.
Fiquei pensando no que faria ali, por volta das cinco da tarde, com uma esferográfica e um jornal, sentado sozinho numa mesa, cochilando e sem ligar a mínima para o mundo a sua volta – mundo que nesse momento passou a incluir duas jovens barulhentas que passaram sem que o homem lhes dedicasse qualquer atenção.
Que profissão teria?  Impossível dizer. Aposentado, é claro. Teria sido funcionário público. Ou encarregado de algum setor de estoque. Contabilizou caixas e pacotes a vida inteira. Entradas, saídas, saldo. Anotou coisas em papeizinhos, fez relatórios, seria o encarregado de chavear o depósito pontualmente às seis e cinco da tarde, quando voltava para casa. Ou quando vinha para a lanchonete?
Eu não sabia nada sobre aquele homem, eis a verdade, nem sobre as duas jovens que voltaram da toalete fazendo aquele alarido com que as mulheres freqüentam as toaletes. O homem não as viu. Agora sua cabeça descia muito devagar na direção da mesa e dois garçons o observavam, rindo de seus cochilos. Quem sabe eu devesse dar uma bronca nos garçons, reclamar com o gerente, acordar o homem, aconselhando que fosse dormir em casa? O homem teria uma casa? Para onde iria aquele homem depois de cochilar naquela mesa de lanchonete?
Paguei minha conta e, ao sair, passei ao lado de sua mesa. A esferográfica repousava sobre o quadriculado de algum quebra-cabeça. Traços desconexos haviam sido rabiscados no jornal. Me afastei preocupado em não fazer barulho algum que pudesse perturbá-lo, mas ainda vi quando a cabeça do homem desceu uma última vez e repousou docemente sobre seu braço. Agora dormia profundamente.

sábado, 25 de setembro de 2010

Sincronicidades tupiniquins

Como essas duas coisas acontecem ao mesmo tempo, faço o seu registro para que futuros arqueólogos das asneiras e patifarias nacionais possam estudá-las.

Hoje – 25.09.2010 – o Supremo Tribunal Federal, exercitando o formalismo cínico, protelador e chicaneiro que infecciona todo o judiciário brasileiro, conseguiu empatar a votação do projeto de origem popular Ficha Limpa – havia que decidir se a lei já valeria para as atuais eleições ou não – sendo que seu presidente, juiz com toga e badulaques, anunciou que não desempataria nada. Adiaria, pronto.

Gil Vicente executa Bush Jr.

Ao mesmo tempo, os desenhos do artista pernambucano Gil Vicente estão ameaçados, pela OAB de São Paulo, através de seu presidente, Luiz Flávio Borges D’Urso, de serem retirados da Bienal. Gil desenhou a si mesmo executando conhecidos bandidos nacionais e internacionais: Bush Jr., Fernando Henrique Cardoso, Lula, Mahmoud Ahmadinejad etc.

Então, para o pessoal da sincronicidade, eu informo: liberar geral para que bandidos concorram nas próximas eleições, tudo bem. Aceitar a manifestação de um artista que repudia esses mesmos bandidos, nenúncaras.

É a cara da república e da democracia tupiniquins.

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Três notas e uma farsa só




Nota Um
Dia desses, entre outras ridicularias, autoridades queriam manter a proibição aos humoristas brasileiros de fazerem caricaturas dos políticos em campanha. Felizmente, a proibição foi cancelada – até porque, imagino eu, os políticos já são risíveis e ridículos sem a ajuda de humoristas.

Nota Dois
Sarkozy, que faria melhor se se ocupasse de Carla em tempo integral, agora está às voltas com ciganos, que deseja expatriar, e a popularidade em queda. Além disso, sofre acusações de financiamento irregular a partidos políticos e troca de favores entre um ministro e a milionária Liliane Bittencourt. Ora, Sarkô, venha para o Brasil que sua Carla será destaque da Beija-Flor e você será reeleito e, de sobra, fará seu sucessor.

Nota Três
O jornal governista egípcio recortou Hosni Mubarak, que estava no fundo de uma foto, e o colocou à frente de seus acompanhantes: Barack Obama e Benjamin Netanyahu entre eles. Pego com a boca na botija, o jornal “esclareceu”: a foto alterada é uma expressão fiel da liderança de Mubarak. Trata-se do realismo fantástico do jornalismo governista: se a realidade atrapalha, tanto pior para ela.

Dispensam-se, portanto, humoristas.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Nasko


Tinha esse nome selvagem e áspero: Nasko. Mas tinha também uma certidão de nascimento na qual constavam inclusive seus avós e bisavós. Todos puros cães huskies.
Cão? Nunca me convenci. Os huskies são lobos ou pelo menos uma criatura inédita entre o cachorro e o lobo. Mostra disso é o seu campo de interesse: muitos quilômetros, motivo pelo qual, dizem, se fugir de casa, não sabe voltar. Não é que não saiba. É que vai longe, anda muito, não volta. Não tem interesse em voltar. Deixassem, continuaria andando outros vinte quilômetros.
Era orgulhoso, nobre, metido. Não obedecia a ninguém. É verdade que a mim ele fazia de conta que obedecia. Me olhava com aqueles luminosos olhos azuis, ficava imóvel, mostrando que, se quisesse, continuaria na mesma. Depois, expressando profundo desprezo pelo mundo, se afastava. A passos lentos. Como quem deixa para lá e não quer se aborrecer.
Não latia, embora soubesse latir. Uivava, como todo lobo. E conversava. Quando queria comida ou entrar em casa – adorava entrar em casa para sentar na poltrona, a cabeça erguida como um monarca observando seus domínios – ficava de pé junto à janela e desenvolvia uma conversação rouca e insistente. Eu respondia num palavreado qualquer e ele seguia a conversa, cada vez mais impaciente. Não desistia enquanto não fosse atendido.
Era nobre e orgulhoso. Independente e insubmisso. Solitário e resmungão. Belíssimo.
Perdi um grande amigo quando ele morreu. Aliás, soube morrer como um sábio.

Quem merece esses políticos?


Uma única coisa me surpreendeu nessa campanha eleitoral: o candidato Plínio ter ironizado, durante um debate, que os presidenciáveis ali presentes estavam todos fazendo pose de bem comportados. Todos bonzinhos.
Não estou fazendo nenhuma declaração de adesão ao Plínio. Assinalo apenas que ele foi o único candidato a dizer alguma verdade. E a verdade é sempre aquilo que subverte. Analisemos a frase dita por ele. A sua força está no desnudamento que realiza dos candidatos, dos debates e dessa campanha cansativa e inútil que assistimos entre bocejos de tédio.
Todos sabemos que os políticos se tornaram marionetes nas mãos de marqueteiros. É lamentável a situação em que se encontram. Precisam medir cada palavra. Cuidar com as olheiras, as sobrancelhas, os penteados. Zelar pela gravata, o terno e o vestidinho. Além da maquiagem e da cirurgia plástica, é preciso acertar o tom de voz. É preciso fazer pose de educado e não criticar demasiado, pois com isso se perde votos. E é preciso evitar idéias, pois elas são entendidas por uma pequena faixa da população. Mais vale urrar frases desconexas em palanques, enfiar bonés na cabeça, comer carne de bode, se fazer de amigão do povo. Nada de análises sobre problemas sociais e econômicos – os eleitores podem desligar a televisão. E, havendo alguma coisa unânime no ar, jamais criticá-la. Se, como dizia Nelson Rodrigues, a unanimidade é burra, sejamos burros. Fazer ares de imparcial, de criterioso, de aberto ao diálogo. Tudo – idéias, projetos, programas, alianças, a história de cada um – deve ser colocado no mesmo caldeirão onde se cozinha uma mistura insossa e disforme. Dizer sim a tudo que possa pescar algum voto. Ao governo que sai. Às pesquisas que rolam. Àquilo que dizem que a maioria pensa. Destacar o positivo, ter horror ao negativo. Não colocar o dedo na ferida – o dedo ficará sujo. Não apontar as brechas por onde se esgotam as riquezas do país, os becos nos quais apodrece a miséria nacional. Não mostrar onde não estudam os jovens, onde não se curam os doentes, onde não são protegidos os velhos, onde não se vence a doença e se vive em meio à imundície dos esgotos a céu aberto. Onde se vive à custa de trocados que dão ingresso a um vasto curral eleitoral. Onde se vive no lixo, na ignorância, sobretudo na mediocridade boçal dos que julgam que chegaram ao paraíso porque compraram um carro velho em setenta prestações mensais. Não discutir o que significa ser a quinta economia do mundo ou supostamente estar paga a dívida externa.
Não causar atritos. Quanto a isso que chamam de reforma agrária, todos são favoráveis, inclusive o governo atual, que não a fez. A reforma política, também: são todos favoráveis. A tributária? Ora, até correm projetos pelo congresso, como é sabido. De resto, são todos ecológicos. Rende votinhos. Pisar em ovos. Andar no fio da navalha.
Por exemplo: alguém viu quebrar o pau sobre a transposição do rio São Francisco? Nenúncaras. Revirar o poço da impunidade e da corrupção? Jamais. É preciso alardear – sendo oposição ou governo, já que a unanimidade é imbatível – que o país vive um momento paradisíaco rumo ao futuro apontado por aquele asfalto perfeito que aparece no filme publicitário cheio de chavões noveleiros. A eleição se desenvolve apenas no plano das imagens. É um jogo de espelhos. Parecer é mais eficiente do que ser. É isso que medem as pesquisas: impressões, imagens. Tantos por cento vão votar nesse e tantos por cento naquele. Por quais motivos e com que grau de informação não importa, nem importa quem são os que votam assim ou assado. As pesquisas, aliás, medem a desinformação e a concordância bovina.
Ora, política de verdade se faz com confronto, ainda que não com agressão. Política se deve fazer com definições e não com palavreado complacente que nada postula. Política tem que colocar uns de um lado e outros de outro.
Ou, parodiando o poeta Manuel Bandeira: “todo o resto será contabilidade tabela de co-senos secretário do amante exemplar com cem modelos de cartas e as diferentes maneiras de agradar” aos eleitores. O que estamos assistindo é uma pantomima deprimente. Todos querendo nos tapear como se fôssemos um bando de idiotas. Ou seremos um bando de idiotas? Nesse caso, os marqueteiros estão cobertos de razão.

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Sofrer não vale a pena

St Denis fez um comentário interessante ao post Sem medo do livro digital, (11.09.2010). Lembrou que quando foram introduzidas as mulas para transporte de cargas do litoral ao planalto curitibano, os carregadores, que até então as traziam nos ombros, fizeram protestos. Isso me lembra algo que disse um dos pioneiros da propaganda no Brasil, um dos três da DPZ: um problema para a introdução de máquinas de lavar roupa no país foi a convicção das mulheres da época de que lavar roupa exigia sofrer e fazer força. Sem isso não era um trabalho digno. Antes de vender, foi preciso convencer às donas de casa de que era necessário mudar essa visão masoquista. O mesmo se deu com a introdução do teclado do micro: velhos jornalistas e escritores não admitiam um teclado macio e silencioso em troca do pesado matraquear das antigas máquinas de escrever. Era preciso fazer força e sofrer para se sentir escrevendo algo de valor. O esforço estava ligado ao ato de escrever – aquele mesmo que fez com que George Simenon, que matraqueou mais de 400 livros, tivesse os dedos achatados de tanto martelar teclas. As novas tecnologias enfrentam esse problema simples: o ser humano não apenas sofre, mas com o tempo se acostuma a sofrer e passa a gostar do sofrimento. Vira uma segunda natureza. Precisamos nos livrar disso.

domingo, 12 de setembro de 2010

Meditações que me dito

Escrevi isso lá por volta de 1982 - século passado, vejam só - e acho que vale a pena repetir aqui:

Não é possível confiar nem na direita nem na esquerda. Basta a gente virar as costas para que elas troquem de lado.

sábado, 11 de setembro de 2010

Sem medo do livro digital

Sempre que surge um novo meio ou uma nova tecnologia, emerge das profundezas humanas o temor de que mundo anterior seja destroçado. Os anunciadores de catástrofes adoram esses momentos, adoram anunciar o fim do mundo. Já aconteceu com a fotografia, que decretaria o fim das artes plásticas, com o cinema, que exterminaria com o teatro, com a televisão, que acabaria com o cinema. Quando os computadores chegaram à imagem, houve quem decretasse o fim da escrita. O monitor do micro seria um buraco negro para a palavra.

Mania antiga. Quando Gutenberg, em meados do século XV, criou os tipos móveis e revolucionou a história do livro, também enfrentou resistências. Dizia-se que essa nova arte de “escrever sem mão e sem penas” tinha algo de sobrenatural e diabólico. Não se temia o fim do livro anterior, mas a proliferação da nova tecnologia. O livro, até então caríssimo, deixaria de ser posse exclusiva de alguns nobres e o populacho passaria a ler, a dar palpites, a discutir idéias e... nunca se sabe onde isso pode parar.

Hoje sabemos que o computador não exterminou com a palavra. Pelo contrário, faz com que milhões de usuários escrevam e leiam textos na tela dos micros, seja em e-mails, blogs, sites, jornais e revistas on-line etc. Se muitos desses textos são toscos ou primários, é bom lembrar que no século XIX só Flaubert escrevia como Flaubert.

Assim, a palavra não morreu. Quem matou a charada foi Millôr Fernandes. Diante dos deslumbrados, que repetiam que uma imagem vale por mil palavras, ele desafiava: diga isso sem usar palavras. Silêncio geral.

O fato é que a palavra sobreviveu, assim como a pintura sobreviveu à fotografia, o teatro ao cinema, o cinema à televisão, a televisão ao computador. E é bom lembrar outro vilão que assombrou aos puristas: as histórias em quadrinhos. Meus professores costumavam esbravejar contra elas, que determinariam o fim da literatura e da inteligência, sendo a fonte da burrice das novas gerações. Deu-se o contrário: as HQs recriaram nosso imaginário e serviram de mote para novas invenções literárias.

Hoje, o fantasma da vez se chama e-book. Dia desses lá estava na televisão uma editora de livros assustada com o fantasma do livro eletrônico. Dizia ela que o e-book seria frio, não teria graça alguma, jamais poderia substituir o livro impresso em papel. Ao seu lado, um sujeito ligado à informática fazia argumentação contrária: o e-book não usaria papel e, portanto, não derrubaria árvores, podendo ser levado no bolso carregado com uma centena de títulos.

Acho que os dois erram, pois supõem que o e-book substituirá o livro impresso. Inúmeros tipos de livros jamais poderão ser editados numa telinha de 14 por 24 centímetros. Por outro lado, o e-book poderá evitar a derrubada de árvores, o que seria bom, mas não nos iludamos, pois, ao surgir o computador, também foi dito que se gastaria menos papel. O que aconteceu, com as impressoras conectadas aos micros, foi o contrário.

A questão é outra. Os editores temem não o fim do livro impresso, mas o fim de sua indústria, que terá que ser repensada. Temem que sumam – como aconteceu com a indústria fonográfica – os seus lucros. E o povo da informática faz de conta que o e-book não tem problemas, tais como telas cansativas e com má resolução, a questão dos direitos de autor, das traduções etc.

Lembro que já ouve outro fantasma nessa história, o livro de bolso. Quando foi lançado, decretou-se que o livro tradicional morreria. Não morreu. Hoje convivem edições de bolso e em outros formatos. No futuro, livros impressos e e-books deverão conviver, como o cinema com o teatro etc. etc. Atendem a usuários, a situações e a objetivos diferentes.

O e-book tem uma desvantagem. Nele se perde o contato físico com o papel, a tinta, o ato físico de virar as páginas. E não sentiremos o cheiro gostoso de um livro novo, que era por onde Hélio Pelegrino dizia começar a crítica literária. Mas, tem uma vantagem: a ausência de fungos em edições fac-similares, que poderemos ler tal como foram originalmente impressas. Os alérgicos – estou entre eles – agradecem comovidos. E me fascina a idéia de andar com uma biblioteca no bolso.

Enfim, todos sobreviverão. O pensamento catastrófico perderá mais essa.